Lusofonia VIII: carta aos amigos lusófonos
Sigo quanto posso –não quanto quero– os debates culturais últimos entre galegos e portugueses, e acho na sua existência um potencial para a Galiza (país, nação, comunidade de cultura, o que quer que seja) de primeiro ordem, significando a alternativa a uma castelhanização dia após dia mais profunda. Sangue novo para um corpo velho. Mas a situação nem deixa de ser complexa e mais talvez do que em ocasiões se reconhece.
Muito difícil deve resultar para os portugueses e outros membros da lusofonia topar com certas atitudes de galegos que, vendo a sua cultura progressivamente substituída pela castelhana, demonstram uma arrogância pouco amável e demasiado exigente com quem deles se aproximar com interesse sincero de debate. A língua galaica, em franca decadência, agonia em sua casa enquanto suas filhas legítimas nem a reconhecem como mãe. Isto é uma realidade, a meu ver, alimentada pelos gerentes habituais dos bens desta senhora, que desejam para ela uma morte «digna» e solitária.
Uma realidade que, infelizmente, apenas a uma pequena parte de conscientes galegos preocupa. Estes últimos têm lutado até a altura contra esta doença com as armas de que dispunham, e entre elas a linguística europeia, que fundamenta a teoria reintegracionista. Ora, é preciso reconhecer que a realidade linguística não tem muito a ver com a realidade social. Este facto leva com demasiada frequência a acharem em Portugal as atitudes galegas como paranoicas. Não pode ser de outro modo. Os galegos profundamente preocupados com este problema apresentam a sua fome de lusofonia salvífica com gritos e pancadas, como o nadador esgotado que mais parece desejar afogar do que ser resgatado pela equipa de salvamento. Assim as coisas, alguns galegos se acham entre uma dura realidade sócio-cultural adversa e a verdade científica (linguística) e, lutando com apenas uma adaga sem gume, alimentam as suas ânsias no fundamentalismo. Quer dizer, atendendo só a verdade fundamental (que acham linguística), e pouco as verdades circunstanciais (sociais).
No final, tão injusto é os portugueses sofrerem o desespero dos galegos quanto os galegos sofrerem a anti-galeguidade que nasce, desde há séculos, à sua volta e ainda em sua própria casa.
Porém, uma atitude nova, mais equilibrada, estimo quer surgir na Galiza. Alicerçada na verdade de suas certas raízes, mas consciente da imagem oferecida ao exterior.
11 thoughts on “Lusofonia VIII: carta aos amigos lusófonos”
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obrigado, já tenho ali guardado o texto sobre a etimologia e história das Asturias. Amanhã leio com mais cuidado. Vocês também dizem obrigado, não?
obrigado, já tenho ali guardado o texto sobre a etimologia e história das Asturias. Amanhã leio com mais cuidado. Vocês também dizem obrigado, não?
Mais comentários sobre cultura nascem no Portal galego da língua.
Bem visto essa do Hespanha. Com aquela notícia lá em cima pisaram-me os calos e primeiro tenho de perceber quem foi…
Os de Castela devem ser os mais agressivos porque aquilo lá é muito seco – o primeiro passo foi subordinar a Galiza verdinha…(portanto c. 1230)
Mas portanto a designação institucional España, aparece quando, ou talvez seja melhor perguntar: qual é o primeiro rei que se reclama “de España”?
Também gosto do “aperta”, nós cá temos um “abraço apertado”, que então é um pleonasmo com muita ênfase!
py,
Hispania era o nome do território peninsular administrado pelos romanos (então anterior à tomada da Ibéria pelos visigodos). Aquando da evolução das línguas romances peninsulares tal denominação depara em Espanha, que melhor deveria escrever-se Hespanha (terra dos hispânicos todos). A “España” que hoje conhecemos é fruto, portanto, do domínio político exclusivo de Castela sobre a Hespanha (Portugal safou-se pela última vez há pouco mais de trescentos anos), que a ver vamos se em nossa vida desfrutamos ultrapassado.
(em Timor eles falam baixinho o português, porque com o Tétum-praça é um escarcéu do caraças)
obrigado meu caro, não sei o seu nome, então tenho de fixar 1230, pelos vistos foi quando começou a hegemonia de Castela.
Já agora aproveito para inteirar-me: a Hispania era uma designação visigótica, não? E não sei bem quando foi retomada, talvez com Filipe II, ou mesmo com o pai Carlos I (V do Império)?
Por outro lado, os lusitanos também andavam por aí nos tempos primevos, antes dos romanos, ou dominava outra etnia?
Seja como for não tinha percebido que tínhamos tanta família por aí. Porque é que vocês não integram, como observadores, a comunidade dos países lusófonos? É uma delícia tanto sotaque e as inovações de cada língua-filha. Lá em Timor eles falam baixinho, género piu-piu.
Em Moçambique, por exemplo os polícias falam o português mais esmerado com que me deparei nos últimos tempos. Moçambique seria um bom parceiro vosso creio, porque eles também integram a comunidade dos países anglófonos, e agora recentemente da francofonia, são muito arejados.
Estimado py:
Acho que o autor que o Sr. AGIL referencia é Camilo Nogueira, de quem trago para aqui uns excertos de uma sua entrevista ao respeito:
«Durante séculos, como mostran con evidéncia as fontes documentais da época, Gallaecia era o reino cristián alternativo de Hispania, como se denominaba tamén Al Andalus. O reino ocupaba todo o territorio da província romana galaica. Al Andalus como território administrado polo reino musulmán non pasou da Cordilleira Central, nen do Pisuerga. Gallaecia, era asi chamado polos árabes e polo Papado un reino con grande presenza en Europa, que mesmo se enfrentou con Roma polo significado apostólico de Santiago. […]
Realmente o curioso é que sexa preciso realizar unha interpretación acorde coas fontes da época, e que esta poida ser considerada heterodoxa, cando o que realmente desvirtua o acontecido é unha leitura que está ao servizo dunha determinada xustificación histórica da necesidade dos Estados peninsulares tal como hoxe son. […]
Esa hexemonia galaica remata con distintas formas. Gallaecia foi un reino independente desde os princípios do século VIII ao 1230. Despois da independéncia de Portugal, no 1143, habia dous reinos galaicos distintos. Despois da caida do Califato de Córdoba, ao fin do primeiro terzo do século XI, comezou un período de inestabilidade política e territorial – antes durante tres séculos non houbo nada significativo que poida ser denominado como Reconquista – que culmina na toma polo rei galaico Afonso VI do estenso reino de Toledo, máis ou menos o território da actual Castilla-La Mancha, que era parte principal de Al Andalus. Entre esa data e 1250 os reinos cristiáns esténdense por toda a Península, durante menos de dous séculos. Gallaecia participou de xeito sobranceiro neste proceso de expansión dos reinos cristiáns. A hexemonia castelá na coroa centro ocidental, exceptuado Portugal, comezou en 1230. Ainda asi, Galiza continuou a ser un reino, sen rei exclusivo. Hai que pensar en relación con Portugal que os condes de Portucale eran membros da dinastia real Galaica, como o podian ser os abades de Sobrado ou Celanova, ou que até o 1400 co Cisma de Ocidente, Lisboa como diócese ainda dependia da metrópole de Compostela. […]
A historiografia oficial responde aos intereses do Estado, e foi construida por acumulación en momentos históricos determinados, que poden ser estudados, comezando pola primeira parte do século XIII, no tempo de Afonso VIII. Foi este o primeiro rei duradeiro que tivo Castela como reino independente, e durante o seu reinado e pouco despois, o arcebispo de Toledo Rodrigo Ximénez de Rada encetou unha interpretación histórica destinada a afirmar Toledo frente a Santiago, e a Castela como reino nacente, ignorando Gallaecia e Portugal, modificando nese sentido varios séculos da história peninsular. A súa interpretación interesada foi recollida por Afonso X, e constitue ainda un dos fundamentos da ideoloxia do Estado español. Ideólogos como Menéndez Pidal e Sánchez Albornoz beben ainda nesa fonte, como o fan os seus continuadores actuais cando interpretan o “estado das autonomias” ou “nacionalidades históricas”. […]
Castela parasitou a coroa central que tiña a sua orixe na Galiza. O reino galaico ficou debilitado polo afastamento progresivo de Portugal e pola instauración de Toledo como nova metrópole, dominada por Castela despois de ser tomada por Gallaecia. […]
O chamado reino Astur-Leonés era Gallaecia. Asi era chamado. León foi capital nun tempo, como o foi Santiago noutro, sendo sempre o centro do reino, e mesmo outras cidades. Salamanca era unha universidade galaica, instituida por Afonso IX. Os profesores de Salamanca eran case todos galegos. Todo isto parece escandaloso para dicilo con normalidade, pero os datos son abondosos. Non hai nada de estraño en que certos lugares de Extremadura, dos que hoxe se está a falar moito, se fale galego: non estamos máis que ante os restos da sua propia língua.» Camilo Nogueira, ANT, nº 748, 1996.
Neste contexto, revela-se muita coisa, como por que durante tanto tempo o galego foi a língua literária da «Corte hispânica principal», e por que o galego deveu ser afastado depois de toda consideração castelhanófila até as suas raízes serem lançadas à terra do esquecimento. O galego tratado assim, na geografia que ficara sob domínio de Castela tendeu à míngua propositada, enquanto em Portugal continuou a florescer e semeou-se pelo mundo.
Obrigado. Então havia o reino da Galiza, tenho de estudar isso, e a capital era aonde? Santiago?
Estou preocupado com isto: http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?section_id=13&id_news=246864
nem pensem os castelhanos (ainda sai o Felipe “embarazado”), agora com os galegos é outra coisa.
Vou dormir sobre o assunto e depois digo.
Se quiserem contar-me coisas, tenho gosto.
Diz py: «Pouco conheço da Galiza, isso era tudo reino de Leon? O nosso Afonso Henriques foi muito esperto, reconheceu o rei de Leão como imperator e a troco foi reconhecido como rex pelo dito, e o papado ficou entalado, mas ainda continuou mais uns anos como dux.»
COM.- Eu diria, segundo afirmam historiadores galegos que não seguem a doutrina histórica dos espanhóis, que o Reino da Galiza era o que incluía Leão / León…
Aliás, a “teoria” reintegracionista é mais do que “teoria”. Decerto integra uma teoria, nem sempre unânime nos pormenores, mas substancialmente homogénea. Para além, compreende práticas diversificadas… e complementares que a abafante pressão do castelhano (espaÑol) oficial e oficioso não consegue “agachar” (= ocultar) nem eliminar.
Talvez uma das armas (sic: mas não militares!) do reintegracionismo seja a sua variedade que por vezes parece desorganização ou falta de organização.
Mas acontece que os estados, também o Reino de EspaÑa, tão organizados eles, são impotentes perante os movimentos cívicos em aparência não organizados (como estados) e perante os estados de opinião insubornáveis, embora “minoritários”, em aparência “minoritários”. (Dificilmente no estado moderno pode achar-se um estado de opinião personalizadamente maioritário; o estado apenas consegue massas sem opinião ou quase…)
Bom dia! Mas então a língua galaica é a mãe da lusofonia? Então estou caçado porque sou gamado na lusofonia, mas cheira-me que o nosso “fado” vem daí… Gostei da foto de Timor, por lá andei…
Pouco conheço da Galiza, isso era tudo reino de Leon? O nosso Afonso Henriques foi muito esperto, reconheceu o rei de Leão como imperator e a troco foi reconhecido como rex pelo dito, e o papado ficou entalado, mas ainda continuou mais uns anos como dux
Também imagino que vocês devem dizer revoluçom, não? Fica mais meiguinho e dá melhor para sussurrar mas olha que revolução é mais eficaz.
Bom mas isto agora é a revoluçom digital e pode ser que vá.
unha aperta :))
(cortei as unhas dos pés no domingo passado por causa das coisas)