
“Visão do médium” e nova recrudescida visão
VISÃO DO MÉDIUM
Escrever um poema deve ser um dilúvio que agoniza,
Que aperta com violência o coração contra si.
Que sufoca até o limite.
Como a imagem do mar no horizonte.
Versos fatídicos (1994-2010) [Edicións Positivas, 2011]
Há dous dias que o editor Manuel Bragado relembrou este meu poema na sua versão de 2011, publicado numa linda edição da Positivas tão genialmente enfeitado com as ilustrações de Alberto Esperante. O poema fora inicialmente publicado na versão que aqui amostro e que, muito mais humildemente, tinha sido publicado em 1995 em edição dos autores polo nosso ativo e inspirado grupo poético da Corunha. Na altura duzentos exemplares foram enviados a bibliotecas, escritores e críticos, mas as respostas, sem falar se boas se más, foram meia dúzia, mais menos. Entre elas, uma muito cara e exótica: a que viu da pluma de Gabriel Nascente, poeta da Goiânia.
Vinte anos passárom e a reflexão torna-se necessária: Fomos considerados maus poetas ou escritores “anti-sistema”? Logrou o “sistema”, com aquela política cultural, evitar o abandono da língua da Galiza? Serve para algo —algo como uma maior divulgação nos meios ou uma maior atenção da crítica— publicar em versões mais institucionalizadas da língua? Têm qualquer futuro essas versões mais institucionalizadas num país em que a cultura se converte, contra o que as leis ditam, na maior órfã da sociedade a quem serve com maior respeito e amor que nenhuma outra indústria?
Obrigado a ti, Manolo, pola tua atenção. Mas a tod@s digo que, com certeza, o “sistema” nem paga nem respeita o esforço de uma sincera vontade artística. Embora com bágoas nos olhos a causa de pensar em mais uma ocasião perdida, no dia do seu passamento não porei os sapatos nem tirarei o roupão para sair. Também não espero já que os meus coetâneos lamentem a minha ausência no espaço público. É por não ter eu amigos? Não, e por morar numa sociedade já quase inane com uma intelectualidade esclerotizada.
Eu tinha há vinte anos uma visão da cultura galega muito crítica. Devia esta sair urgentemente dos velhos parâmetros culturais (recomendo a leitura que da década de 70 já fazia o Xavier Alcalá e que recentemente revisou em Tertúlia revisitada), sintetizáveis numa estratégia de resistência para uma cultura ainda viva na inércia popular. Passado este tempo, em que me abri a muitas perspetivas no caminho da maturidade, em que me mostrei mais participativo e muito menos revoltado, concluo que a cultura está adoecida do mesmo mal e que aquela perspetiva minha, jovem, ousada e não claudicante era apropriada. E que hoje, mais que nunca, é necessária.